sábado, 30 de março de 2013

Dominar é matar o Amor

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por Nahman Armony

Algumas pessoas impõem de tal forma os seus desejos ao parceiro que ele acaba por se anular, tornando-se fraco, desinteressante. Muitas vezes o comportamento é fruto do medo de perder: tenta-se eliminar do outro tudo o que possa atrair os olhares alheios. O resultado é que mesmo o próprio olhar vai querer afastar-se, pois o antigo objeto de amor torna-se indigno de ser amado.
. Uma das armadilhas prediletas do amor é a exigência de dedicação incondicional do parceiro. De início, a vítima tenta resistir, manifestando os seus desejos, discutindo, fazendo acordos. Mas se o outro é uma pessoa ardilosa, que exibe sofrimento diante das frustrações causadas pelos atos afirmativos do parceiro, este acaba cedendo, desistindo dos seus valores e da sua postura independente. Em nome do amor, torna-se servo.
E, quando a mudança se instala, parte do que era atraente nele - a força de sua personalidade, a diferença, o desafio, a incerteza - desaparece.
Uma imagem exprime bem a situação: chupar a fruta até tirar dela todos os elementos nutritivos e então cuspir o bagaço.
A dobradinha admiração/aprovação faz parte da composição amorosa. A pessoa sente-se valorizada quando é amada por alguém que admira e a aprovação dessa pessoa torna-se um elemento importante no equilíbrio da relação. Os conflitos muitas vezes surgem do sentimento de que um não está sendo devidamente apreciado pelo outro, e são resolvidos por acordo entre iguais.
Se o parceiro não tem vontade própria, se concorda com tudo o que o outro deseja, desaparece como pessoa e não pode mais ser admirado. A sua aprovação ou desaprovação deixa de ser relevante: já não serve para a auto-estima, para o orgulho de ter um parceiro altivo; já não é um parceiro de luta, pois a sua personalidade e força sumiram. Onde deveria haver dois a enfrentar o mundo sobra apenas um com sua rabeira: uma sombra sem força de realização.
É uma situação paradoxal: deseja-se uma pessoa forte mas tem-se medo de que essa força atraia outros, provocando o abandono. Faz-se então um esforço para dominá-lo até que ele se torne uma criatura fraca, indigna do amor e incapaz de realizar uma parceria produtiva. Isso nos leva a pensar que em certo número de casos a insegurança é um dos componentes que mantêm o amor.
Estas considerações baseiam-se num caso que ocorreu na minha clínica. Um rapaz de início tímido havia se tornado auto-afirmativo, adquirindo charme e densidade, usando a sua inteligência para estabelecer relações. Tinha romances que duravam algum tempo e, ao terminarem, causavam um sofrimento que não chegava a atrapalhar a sua vida. A auto-estima e o garbo mantinham-se. Até que, ao se apaixonar por uma mulher que considerava especial, passou a ter um medo excessivo de perdê-la, como se não a merecesse.
Diferentemente das situações anteriores, em que se sentia em plano de igualdade ou mesmo de superioridade, pôs-se em situação de inferioridade e passou a atender às solicitações da namorada mesmo se contrariavam seus sentimentos e princípios. Logo perdeu a individualidade e, com isso, o charme e a essência.
Deixou de existir como pessoa e foi descartado, ficando num estado de extremo sofrimento e desvalorização. A sua autoestima desapareceu e demorou para começar a recuperar a sua identidade e a sua potência.
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O amor exige concessões de parte a parte. Mas certos princípios e sentimentos básicos pessoais não podem ser abandonados, sob pena de um desenvolvimento desfavorável da relação e, pior, de uma transformação de um ser humano consistente em uma inconsistência perigosa para o próprio viver.

(fonte Portal CARAS -Amor, aqui: http://www.caras.com.br/edicoes/794/textos/9689/ )
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